quarta-feira, outubro 27, 2010

Descobrir-se

Já tive vontade de formar uma fortuna, mas dinheiro não é o meu negócio
Já tive vontade de ir para uma tribo indígena, mas lá não tem rock
Já tive vontade de deixar a matemática, mas ainda não resolvi a equação da minha vida
Já tive vontade de dançar, mas não tenho parceiro
Já tive vontade de morar na mata, mas tenho medo de aranha, cobra...
Já tive vontade de ficar careca (quase fiquei), mas como balançar os cabelos ao vento?
Já tive vontade de ter um carro, mas assim não encontraria tantas pessoas legais no ônibus todos os dias
Já tive vontade de florir meu quintal, mas as flores são caras
Já tive vontade de sorrir pra todo mundo, mas a malícia das pessoas me sufoca
Já tive vontade de voar, mas o ar é muito poluído
Já tive vontade de amar intensamente, mas ninguém mais sabe amar
Já tive vontade de ter muitos amigos mas eles estão distantes de si mesmos
E agora...
Já não sei do que tenho vontade
Já não sei o que quero saber
Mas essa é a melhor parte
To tentando construir minha arte

texto escrito em 2009

Hoje eu já sei do que tenho vontade
Hoje eu sei o que quero saber
Parece que terminou, mas ainda estou na melhor parte: estou descobrindo a construir minha arte

domingo, julho 11, 2010

Samanta

Fábio atravessava a rua todos os dias no mesmo ponto da cidade, via as mesmas mulheres - uma mais bonita que a outra, dizia consigo mesmo -, assistia o mesmo canal de TV, comia as mesmas comidas preferidas, ouvia as mesmas músicas e vestia sempre primeiro a meia do pé esquerdo. Fazia as coisas meio que mecanicamente, uma prova viva do filme "Click", a diferença é que ele gostava do caráter rotineiro de sua vida. Tinha uma obsessão particular que era também uma diversão, observava o sorriso de todas as mulheres que encontrava, queria ter o sorriso mais bonito para si, não se importava com o resto, queria o sorriso e o Coringa era uma versão distorcida e de muito mau gosto de toda subliminar beleza do sorriso.

"Mas que viagem infeliz", saiu murmurando do escritório do chefe. Tão apegado a sua rotina, detestava essas viagens imprevisivas que seu chefe inventava, mas não podia ser diferente já que era um homem atento aos detalhes, cuidadoso, responsável e outras características que toda pessoa perfeccionista como ele tem, o funcionário certinho que todo chefe confia. Desta vez seu chefe tinha absurdamente passado do ponto:

"O Ricardo terá que ir com você, ele é o técnico responsável pelos equipamentos e você irá dirigir o negócio".

"Me mata logo", ainda se queixava. Teria que dividir o quarto do hotel com o tal de Ricardo que atrapalharia toda a sua sagrada rotina e pensava a todo instante que morreria ou mataria o outro. No final, não sabia se tinha pânico ou raiva.

"Mas isso vai ficar aí? Tem que por na mesa.", perguntou Ricardo sobre o equipamento de informática que havia ficado no chão dando lugar aos utensílios de seu quase ritual, o máximo que Fábio conseguia manter estando tão longe de casa.

"É." Limitou-se a responder.

Ricardo conhecendo seu 'jeitão esquisito' - assim que o descreviam na empresa - não tentou argumentar e fazia de tudo para ignorar as manias do administrador, abria a janela do hotel de manhã cedo, fazia suas calóricas refeições fora de hora e mexia com as moças que passavam por perto, enfim... Estava viajando a trabalho, mas não deixou de aproveitar. Fábio, enquanto não estava tratando dos negócios pensava em como não deixar o colega atrapalhar sua rotina e assim foi toda a viagem.

Duas semanas depois: "Fábio, a nossa filial na Espanha solicitou ... e você será o encarregado, desta vez quem irá auxiliá-lo é a minha esposa, ela é especialista na área que eles estão precisando."

"Vou incomendar meu caixão." pensou fazendo força para não demonstrar o descontentamento que sentia. Viajar era ruim, acompanhado pior, de uma mulher então era o fim. As vezes era tão pessimista quanto perfeccionista. Chegou a pensar em pedir demissão, mas tentou se acalmar e sugeriu que outro fosse em seu lugar.

"O que há? Você que é o meu homem de confiança e eu mesmo iria, mas a empresa tem umas demandas neste momento que me impossibilita a saída. Já pedi a secretária que compre as suas passagens e as passagens de minha esposa, vocês vão na quinta."

Estava ficando triste, mal tinha chegado de uma viagem ruim e já tinha que ir para outra, talvez pior. Fez a mala como se estivesse indo para o corredor da morte. E se acaso atrasasse? Poderia haver um acidente no caminho para o aeroporto que resultou num engarrafamento e causou o atraso, assim começou a maquinar uma desculpa para um futuro atraso. Mesmo pensando em várias possibilidades, não conseguiu, chegou ao aeroporto na hora certa, apesar de olhar para todas as direções procurando um acidente aqui e ali, mas parecia que todos haviam resolvido ser prudentes no trânsito aquele dia numa sórdida conspiração contra ele.

O chefe ainda não tinha chegado com a esposa. Começou a imaginar como ela poderia atrapalhar seus hábitos, desta vez não ia ter que dividir o quarto mas achava que ela iria querer que ele a levasse para fazer compras, fazer o cabelo, visitar lugares importantes para depois fazer inveja às amigas, essas coisas de mulher. Solução: contratar um motorista, sairia do seu bolso, no entanto, seria um dinheiro bem gasto, tudo em nome do sossego. Pensou afinal que a viagem poderia não ser tão ruim, só tinha agora que pensar numa forma de mantê-la calada, mulher fala muito.

Piscou os olhos várias vezes, achou que estava tendo uma alucinação. Custou a acreditar. A coisa que Fábio mais procurou em toda sua vida ali ao lado de seu chefe. Perguntem como era o cabelo dela, a cor dos olhos, até o tom da pele que Fábio não saberia responder, ele só viu o sorriso.

"Olá Fábio, não nos atrasamos né?"

Fábio nem ouviu o que seu chefe disse.

"A senhora tem um sorriso lindo!", dirigiu-se à mulher maravilhado. Ela sorriu desconfiada e lançou um olhar indagativo ao seu marido, pois tinha notado que Fábio não o havia cumprimentado.

"Todos dizem o mesmo, ainda bem que eu vi PRIMEIRO!" Deu ênfase ao 'primeiro' no que parecia ser uma mensagem subliminar que dizia: 'é minha e ninguém tasca'.

"Bom dia senhor." Respondeu finalmente voltando a si.

Embarcaram. Olhava para ela incessantemente, disfarçando o máximo que podia. 'O que fazer agora? Ela é a mulher da minha vida, o sorriso mais lindo, Da Vinci teria pintado ela ao invés da Monalisa, ela é perfeita e... também a esposa do chefe'. Dilema cruel. 'Será que ela percebeu o quanto me fascina?' 'Será que ela irá me corresponder?' 'A levarei aonde ela quiser.'

Samanta era uma mulher discreta, sem muitos caprichos e objetiva. Ao contrário do que Fábio pensara, não foi fazer compras, ao salão ou as outras coisas que ele havia previsto, o que o deixou triste porque com tal beldade ele passearia e até quem sabe tiraria umas fotos. Claro! Fotos só de rosto. Perguntava sempre se ela queria algo, queria ser útil a tão estimada senhora, mas ela dizia que não. "Ô mulher sem vontade", chegou a reclamar baixinho, impaciente por uma brecha, uma oportunidade de se aproximar.

No dia seguinte ela estava atrasada, a reunião na filial seria dali a uma hora. Bateu na porta do quarto e ninguém respondeu. Estava ficando preocupado. A camareira que passava no corredor parou perguntando:

"Porque bate nesta porta? Já não há hospides aí."

'Como assim? Não pode ser. Onde ela está?' As perguntas iam pipocando em sua mente e a preocupação só aumentava.

"Ela saiu no meio da madrugada às pressas, deixou a conta de vocês dois paga." Disse o funcionário do hotel.

Não estava entendendo mais nada. Será que ele havia feito algo errado? Nunca se perdoaria. Bom, tinha que ir à reunião. Chegou à empresa filial e notou um clima estranho, todos sérios, poucas palavras. 'Eu lamento', ouviu alguém dizer. O pânico estava tomando conta dele até que perguntou a um dos funcionários:

"O que está acontecendo? Estão todos tão sérios..."

"Então você não sabe? O filho do dono da empresa sofreu um aciedente e morreu."

Fábio ficou inconsolável. Todos o admiraram por ser tão solidário à dor do próprio chefe. Ele pensou: 'O filho dela morreu, ela nunca mais vai sorrir'.

sábado, julho 10, 2010

Noite, Dia

A noite é bonita, fria também e silenciosa. Ah é! Todos sabem isso, mas poucos param para sentir a noite. Todos sabem porque os outros falaram, mas a maioria nunca passou uma noite em claro olhando o escuro ou ouvindo o barulho dos bichos, hoje eu fiquei. Ouvi até um jumento relinchando, vi os grilos pulando nas árvores, senti o frio da noite que de jeito nenhum traz solidão (isso é coisa de coração ferido) e agora... o dia está clareando.
Enquanto a noite traz paz e tranquilidade, o dia traz calor e vida e a cada amanhecer a esperança se renova como uma flor que brota com a aurora.
Não! Nâo tape meu Sol, não impeça que eu receba este calor que emana do meu Pai. Ningu
ém pode tirar isso de mim nem o aconchegante frio da noite, nem o brilhante calor do dia.

PS: A parte que o c
éu fica um mix de amarelo terra, laranja e vermelho fogo é que é mais bonita. Renova as esperanças e aquece o coração.

quarta-feira, junho 02, 2010

Coisas de insônia

Ainda que as lembranças não lhe doam tanto como antes, há na mente a nostalgia que transforma os dias em preto e branco.
1, 2, 3.. Conta as batidas do coração, conta as tábuas da parede, conta as variações das cores nos móveis, conta os galhos das árvores, conta tudo. Conta tudo numa incessante compulsão que lhe preenche os momentos vazios.
Ainda procurando seu verdadeiro caminho, e neste compreender os seus anseios, desabafar as suas imcompletudes, vagar nas suas perguntas e parar (quem sabe), no que poderia ser a luz, luz da sua essência que brilha não sabe como. Só brilha.

--Brilho da lua cheia, brilho do sol, das estrelas.


Assim fala e clama, na esperança de ser ouvida e compreendida. Não sabe ela que está tudo ali bem, ao seu lado, tudo que ela quer, esperando que ela aprenda a ver e sentir.
Quem sabe... Se se deixasse a mente fluir. Era só disso que precisava para se sentir bem (ou não). Nunca sabia ao certo o que precisava. Talvez precisasse conhecer a si mesma e só então saber realmente do que precisava, seria o primeiro passo para tudo. Ao menos já sabia o que a fazia bem naquele momento.

quarta-feira, maio 26, 2010

Questionamentos

"-- Muitos dançam sobre o solo,
Mas não na pista do autoconhecimento.
São deuses que não reconhecem seus limites.
Como poderão se achar se nunca se perderam?
Como serão humanos se não se aproximam de si?
Quem são vocês? Sim, digam-me, quem são?"
Augusto Cury